Vida em Condomínio: O morador antissocial
- brenostef
- 10 de mar. de 2021
- 4 min de leitura
Você já ouviu falar do condômino antissocial? Certamente não estamos a tratar daquela figura que reside no seu condomínio e não se relaciona com ninguém. O comportamento antissocial aqui abordado está presente naquelas situações em que a estabilidade das relações entre condôminos é gravemente ameaçada, inviabilizando a convivência social[1].
Sem juridiquês: é aquele comportamento nocivo de determinada pessoa, que rotineiramente afronta direitos fundamentais dos demais moradores do condomínio, tais como direito à vida, à liberdade, à segurança e à igualdade.
Recentemente o programa Fantástico, da Rede Globo, apresentou uma matéria sobre um morador de um prédio que da varanda de seu apartamento atirava com armas de airsoft nos animais de estimação de seus vizinhos, nas janelas dos apartamentos e vivia praticando ameaça contra todos que de alguma forma o incomodavam[2].
Esse é um caso típico de condômino antissocial.
E eis que surge a dúvida: o que fazer em relação a um morador que possui atitudes como esta? Os condôminos podem determinar a exclusão do morador antissocial do condomínio? Que outras medidas podem ser tomadas?
O Código Civil[3] é o diploma legal que contém disposições sobre o condomínio e é lá que encontraremos as respostas buscadas (existem outras leis que também estabelecem algumas normas para os condomínios, mas em termos gerais é no Código Civil que iremos nos amparar).
O Artigo 1.337, do Código Civil, estabelece que:
O condômino, ou possuidor, que não cumpre reiteradamente com os seus deveres perante o condomínio poderá, por deliberação de três quartos dos condôminos restantes, ser constrangido a pagar multa correspondente até ao quíntuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, conforme a gravidade das faltas e a reiteração, independentemente das perdas e danos que se apurem.
Parágrafo único. O condômino ou possuidor que, por seu reiterado comportamento antissocial, gerar incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores, poderá ser constrangido a pagar multa correspondente ao décuplo do valor atribuído à contribuição para as despesas condominiais, até ulterior deliberação da assembleia.
É fundamental ficar claro que a penalidade estabelecida neste artigo do Código Civil tem natureza diferente daquela multa aplicada ao condômino que cometeu uma simples falta, uma única vez.
A lei (o código civil) diferencia uma da outra e, como não poderia deixar de ser, permitiu a aplicação de uma penalidade muito maior ao condômino que insiste em cometer as tais faltas de forma reiterada.
O mesmo vale para o condômino antissocial. No caso dele, a multa poderá ser de até 10 vezes o valor da cota condominial, enquanto no caso de uma falta simples ela deverá ser de apenas uma cota condominial.
Até aqui parece fácil. A solução trazida pela lei para o caso do condômino antissocial é a aplicação de uma multa de valor muito elevado que, em tese, fará com que ele deixe de adotar as condutas antissociais.
Claro, há uma série de procedimentos/ritos que o síndico, administração e conselho consultivo, deverão adotar para que a multa seja efetivamente aplicada de acordo com a lei, mas basicamente a aplicação da multa seria a medida final definida em lei.
Mas e se a multa, por maior que seja, não é suficiente para fazer cessar as condutas antissociais?
Neste caso a lei silencia, ou seja, o Código Civil estabelece apenas a aplicação da multa, de forma que em sendo necessário ir além da multa, será preciso socorrer-se ao Poder Judiciário.
Poderão ser solicitadas a um juiz medidas como busca e apreensão de bens, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e, se necessário, através de reforço policial, mas desde que a solicitação seja direcionada a um juiz e este autorize tais medidas.
Porém ainda assim pode ser que a solução única para o condomínio seja a exclusão deste condômino, medida extrema e muito polêmica no âmbito dos tribunais.
Para estes casos não há unanimidade dentre os juristas, mas há sim alguns de grande renome - como o Desembargador Francisco Loureiro que tive a honra de ter como professor, que defendem a possibilidade de exclusão deste condômino, o que se daria através da venda judicial do imóvel[4].
Evidentemente, dada a gravidade da situação, que colide com o direito à propriedade, somente situações muito extremas poderiam ensejar na exclusão do condômino, mas muitas vezes este é o único caminho.
Casos graves de condôminos antissociais não são raros e certamente foram agravados pelos danos psicológicos provocados pela pandemia do covid-19. Esta é certamente uma situação extrema, porém ainda assim é preciso agir com cautela para que todos os ritos e procedimentos legais sejam seguidos e o condomínio e condôminos consigam retomar sua rotina regular.
E é exatamente por isso que em casos como este o condomínio deve contar com assessoria jurídica especializada, garantindo que seus passos sejam todos dados de acordo com a lei.
Finalmente, a reposta então é a de que contra o condômino antissocial poderão ser adotadas diversas medidas restritivas, que poderão culminar com sua expulsão do condomínio, porém por se tratar de tema muito controverso em nossos tribunais é fundamental a análise do caso concreto por um advogado especialista em direito condominial.
[1] Comentários ao Código Civil/Luiz Edson Fachin. São Paulo, Saraiva, 2003, v.XV, p.261. [2]https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2021/01/17/atirador-mira-em-cachorros-acerta-tiros-em-janelas-e-gera-panico-em-predio-de-alto-padrao-em-sp.ghtml [3] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm
[4]Código Civil Comentado : doutrina e jurisprudência / Francisco Eduardo Loureiro e outros autores; coord. Cezar Peluso. – 13ª ed. – Barueri/SP : Manole, 2019
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